Crónicas do Myanmar: A Road to Mandalay – Parte III

Tal como referi na crónica anterior, a probabilidade de cairmos numa “tourist trap” e sermos levados, pelo nosso motorista, para um restaurante horrível, e super caro, era muito elevada, e, como manda a lei de Murphy, foi o que realmente aconteceu. A comida era péssima, de influência chinesa, e custou-nos o triplo do preço em relação a um restaurante “normal”: Cerca de dez euros pelos dois. Comemos rapidamente, e desandámos dali para fora, furiosos com o nosso guia, que, apesar de ter ganho comissão, perdeu a gorjeta generosa que lhe íamos dar no fim do dia. 

A paragem seguinte, aconteceu na Su Taung Pyi Pagoda. Edificado no século XI pelo rei Anwartha, este famoso templo, localiza-se no topo do monte Mandalay e possui uma vista incrível, de 360º, sobre a cidade. De acordo com a lenda, no seu tempo de vida, Buda e os discípulos terão subido ao topo do monte, e profetizado que uma próspera, capital haveria de nascer naquela zona. Em memória deste acontecimento, foi edificada uma pagoda e colocada, no seu interior, uma enorme imagem de Sidharta. Para além da vista incrível, e da experiência espiritual, já que é visitada, diariamente, por centenas de crentes, existem, na envolvente, inúmeros artistas a vender pinturas, esculturas e trabalhos fotográficos, o que confere ao templo uma atmosfera única. Outro aspecto que me tocou na visita, foram as pinturas com cenas da vida de Buda, que me ensinaram, um pouco mais, sobre a sua história e a relevância que ocupa na vida cultural, e religiosa, do Myanmar. 

Su Taung Pyi Pagoda

Morada: Mandalay Hill, Mandalay, Miyanmar

Website: Tripadvisor

Horário: Durante o período da luz solar.

Preço da entrada:  5 euros (7000 Kyats) Já em cima da hora de voltar para apanhar um dos pores-do-sol mais incríveis da Ásia, voámos para a Ava Island, antiga capital, entre os séculos XIV e XIX, de inúmeros reinos do Myanmar. Local repleto de pontos de interesse, entre pagodas, mosteiros e os vestígios de um palácio, é um sitio incrível, que, possui, apenas, um “pequeno” defeito: Após apanharmos o pequeno barco, que faz a ligação com terra, numa viagem que não dura mais de dez minutos, o único meio de transporte disponível para percorrer os seis quilómetros de distância em relação aos monumentos, é a carroça. Vocês não estão a ver 5.75 leitores, a nossa cara, ao perceber que seriamos, literalmente, obrigados a participar nesta verdadeira exploração animal. Ainda implorámos por um Tuk Tuk, uma mota, ou qualquer outro veículo, mas a máfia estava montada: Teríamos que pagar 20 000 Kyats, o equivalente a doze euros) para alugar uma carroça. Tentei pedir, por gestos, ao condutor, que não agredisse o pobre cavalo, e ele pareceu entender.  Muito a medo, e super consternados, lá iniciámos o percurso pela ilha.A carroça era velha, e rangia por todos os lados, ameaçando desintegrar-se a qualquer momento. A rezar aos santinhos todos para que não houvesse um acidente, lá conseguimos parar naquele que é considerado o principal ponto de interesse, não só da ilha, mas, também, de Mandalay: O Shwenandaw Monastery. Integrando a lista indicativa da UNESCO, este impressionante mosteiro construído, no ano de 1834, integralmente, em madeira, fazia, originalmente, parte do palácio real de Amarapura, até, ter, em 1878, sido transposto para a ilha, uma vez que se acreditava estar assombrado pelo fantasma do rei Mindom Min. Pelo que conseguimos saber através do nosso motorista, existiam dezenas de construções semelhantes no Myanmar. Contudo, nos anos da ditadura militar (1962 – 2011), foram desmantelados e vendidos para outros países budistas, como, por exemplo, a Tailândia, pelo que, este, é o ultimo do género existente no país, daí a sua relevância. Confesso que, no meio de tanta espectacularidade monumental, este foi, talvez, o templo que mais me impressionou. Fechando os olhos, facilmente poderia ver o Mr. Myagi do “Karaté Kid” ou o “Panda do Kung Fu” a treinarem nos varandins. (Quase) Valeu a chatice do transporte e a viagem de carroça. 

Shwenandaw Monastery

Morada: Ava Island, Mandalay, Myanmar.

Website: Tripadvisor

Horário: Todos os dias, 09.00h – 17.00h.

Preço da entrada:  6 euros (10000 Kyats) – Inclui o acesso aos restantes sítios arqueológicos da zona.

A restante hora que nos sobrou, e uma vez que estávamos mesmo, mesmo em cima da hora do pôr-do-sol, foi investida em conhecer os restantes sítios arqueológicos da ilha, que são, também eles, de cortar a respiração. Para além do Maha Aungmye Bonzan Monastery, um mosteiro construído em 1818 e restaurado no ano de 1873, também a Lawka Tharahpu Pagoda, bem como as Yadana Hsimi Pagodas, são sítios dignos de nota e que mereciam mais algum tempo para os visitar. De salientar que este mosteiro, construído em 1818 pela rainha de Bagyidaw como residência do seu sacerdote-chefe, é inspirado nas construções similares em madeira, mas na versão de alvenaria, para ser mais duradouro, sendo, verdadeiramente, magnífico e impressionante. Apesar da irritação com a carroça, valeu, mesmo, a pena visitar a ilha de Ava, que nos permitiu mergulhar, verdadeiramente, na história de Mandalay e no período mais próspero da região.

Já mega atrasados, dissemos adeus, sem grande saudade, ao nosso “cocheiro”, e seguimos, a todo o vapor, para o centro da cidade, onde nos estava prometido um dos mais “dramáticos”, pores-do-sol da Ásia. Claro que o barco atrasou porque não tinha os passageiros suficientes para a travessia, e, nem com o aceno de alguns dólares, o nosso barqueiro acedeu em fazer o nosso transporte. Era muito azar, vir do outro lado do mundo e perder a melhor experiência que a cidade tinha para nos oferecer.  

Considerada a mais antiga, e maior, ponte sobre estacas do mundo, a U Bein Bridge foi construída em 1850 sobre o lago Taungthaman. Possuindo 1.2 km de cumprimento, é suportada por 1086 barrotes de madeira, sendo considerada uma das melhores experiências, não só de Mandalay, mas do próprio Myanmar, uma vez que, tal como referi, é o ponto de observação de um dos pores-do-sol mais incríveis da Ásia.  

Após uma atribulada travessia de barco, chegámos perto das 18.00h já com o sol a desvanecer-se no horizonte, pelo que tivemos que correr e furar a multidão. Entre birmaneses, chineses e ocidentais, a concentração de pessoas é gigante, e convém ir cedo para apanhar um espacinho, coisa que, naturalmente, não fizemos. Após alguns minutos de sufoco, lá conseguimos entrar na ponte e receber a recompensa pelo sprint que nos fez largar os “bofes pela boca”: O pôr-do-sol mais belo, não da Ásia, mas das nossas vidas, só igualável pelo de Bagan. O laranja impressionante do céu, com as pequenas embarcações dos pescadores, e dos turistas, em pano de fundo, potenciam, de facto, um espectáculo único. Só por si, este momento, valeu toda a viagem, e o esforço de lutar pela vida entre as centenas de turistas.  As imagens falam por si, e podem acreditar, que não têm filtro. 

Ficámos na ponte até o ultimo raio de luz se desvanecer no horizonte e a multidão se dissipar para conseguirmos andar, calmamente, pela ponte, que parece ser segura, apesar de balançar e ranger um pouco. A morrer de fome, decidimos compensar a “banhada” do almoço, aproveitar a última noite em Mandalay e procurar, no Tripadvisor, um restaurante decente com comida tipicamente birmanesa. 

U Bein Bridge

Morada: Taungthaman Lake, Mandalay, Myanmar

Website: Tripadvisor

Horário: Não fecha.

Preço da entrada:  Gratuita. 

A escolha recaiu sobre o Golden shan, um buffet de comida birmanesa, com influência chinesa da etnia homónima, uma das representativas no Myanmar. Por 5000 Kyats, cerca de três euros, tivemos direito a comer até nos sair agridoce pelo nariz. Para além da comida absolutamente divinal, que incluiu, entre outros, caris, pratos agridoce, e com raiz de lótus, que, diga-se de passagem, é óptima, e nunca havia experimentado, o ambiente é descontraído, o staff super simpático e prestável, e, para standards birmaneses, estava razoavelmente limpo.

Um pormenor particularmente curioso, é o facto de as paredes estarem revestidas com cartazes de clientes do mundo inteiro, e, é claro, que o do Tuga não podia faltar. Após uma maravilhosa, e inesquecível, refeição, voltámos ao hotel, felizes por termos desfrutado, ainda que em pouco tempo, da lindíssima cidade de Mandalay. Já estávamos, praticamente, a entrar no quarto, quando ouvimos barulho na varanda do piso: Era um grupo de espanhóis, alemães e neozelandeses, que estavam a viajar pelo Myanmar e se tinham conhecido aleatoriamente.

Convidaram-nos para nos juntar, e beber uma cerveja. Era pessoal fixe, e muito afável, pelo que aceitámos. No meio da conversa, ouvimos a seguinte história, contada por um espanhol, o Manuel, que estava a conhecer a Ásia com a sua amiga alemã, da qual não me recordo o nome: “Na semana passada, fizemos a ligação, por via área, entre Yangon e Bagan, com a Golden Myyanmar. Ao fim de dez minutos, o avião ia-se despenhando, e tivemos que voltar para o aeroporto. Íamos tendo um AVC”. Olhámos um para o outro, como que a indagar se voar com companhias birmanesas seria boa ideia, uma vez que íamos usar este meio de transporte um pouco mais à frente. Felizmente, no dia seguinte, iríamos, de autocarro, para Kalaw, cidade onde começa o trekking de quarenta quilómetros até ao Inle Lake. Por entre montanhas e montes, avizinhava-se mais uma viagem, cheia de perigo e animação.  

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