Crónicas do Myanmar: Descobrir o Inle Lake – Parte II

Caros 5.75 leitores, em plena pandemia, ao reviver os momentos tão felizes que passei no Inle Lake, e em toda a viagem ao Myanmar, confesso que é impossível conter uma, ou outra, lágrima atrevida que se me esboroa pelo rosto. De facto, a simpatia, a beleza e a magia do país, ficam impregnados no nosso ser, passando a fazer parte de nós, evocando a tão portuguesa saudade. 

Lamechices à parte, e tal como vos tinha contado na crónica anterior, estávamos no terceiro, e último, dia no lago, pelo que queríamos disfrutar ao máximo. Uma vez que precisávamos de um barco para visitar os locais mais interessantes, falámos com o alojamento que, por cerca de quinze euros, arranjou um barqueiro para nos acompanhar durante um dia completo. 

O céu amanheceu cinzento, e tememos que chovesse, mas não havia nada a fazer. O tempo era pouco e tínhamos que aproveitar. Assim, às oito em ponto, tomámos o pequeno almoço no alojamento, e partimos à descoberta. Um dado curioso é que, a partir de qualquer guest house, é possível marcar um taxi, ou um autocarro para qualquer parte do Myanmar, e a preços mais simpáticos dos que nos sites das agências. A única questão complicada é o mau estado das estradas pelo que, na maior parte dos trajetos, e até para poupar tempo, optámos por voar. 

O nosso barqueiro, de cujo o nome não me lembro, era um rapaz novo e simpático. Contudo, super pedrado pelo consumo de uma droga muito popular no sudoeste asiático, denominada Paan, que consiste numa combinação de folha de bétula, noz de areca e calcário triturado, que se mastiga e cospe. No Myanmar, é muito comum, pelo que vou falar sobre ela num post mais à frente.

Dado o baixo custo do serviço, e porque temos por princípio gastar o nosso dinheiro com agentes locais, combinámos dar-lhe uma generosa gorjeta, sobretudo no caso de não nos tentar impingir tralhas e almoços para turistas, o que, dado o seu baixo nível de inglês, nos deu a nítida sensação de não ter percebido uma única palavra, apesar de abanar a cabeça em jeito afirmativo.

Logo no inicio da viagem, pedimos, encarecidamente, que passasse perto dos famosos pescadores do lago, os quais, pela sua habilidade em manusear o leme com os pés, e a saung, uma armadilha cónica feita a partir de paus de bambú, com as mãos, são um dos mais icónicos postais do Myanmar. Por cinco dólares, que acabámos por não ter que pagar, uma vez que não nos aproximámos o suficiente, fazem a pose perfeita para turista ver. 

Incrível, não é? Parece um bailado, tais são as inúmeras capacidades necessárias para praticar este tipo de pesca, tais como o equilíbrio, a coordenação, a força e a agilidade. Estes pescadores, fazem parte da comunidade Intha, a etnia predominante entre os duzentos mil habitantes do lago, e os grandes responsáveis pela produção de alimentos, através da pesca e da agricultura. 

A primeira paragem, recaiu numa oficina de ourivesaria que produzia peças em prata. “Outra armadilha para turista, pensei”. Um pouco a contragosto, lá acabámos por entrar, e, devo confessar, que gostei bastante. A arte de trabalhar o metal, com fins ornamentais, sempre me fascinou, nomeadamente desde as aulas de pré-história da licenciatura em Arqueologia, e, estar a ver, ao vivo e a cores, foi uma experiência incrível.

As peças, produzidas em prata de boa qualidade, eram lindíssimas e a preços muito simpáticos. A partir dos dez euros, era possível trazer um anel ou uns brincos espetaculares, inspirados na estética da etnia Shan, de origem chinesa, a mais populosa das minorias do Myanmar. E, não. O anel de noivado acabou por não sair, mas trouxemos um anel para moi meme, e para as nossas mães, o que já não foi mau. 

Em seguida, e porque não há mercado nem mercadinho onde o #lobo não ponha o focinho, (e o resto também), rumámos ao famoso mercado flutuante, que acontece todos os dias da semana, pela manhã, mas que é organizado em locais diferentes, pelo que é importante perguntar, no alojamento, antes de ir.

Artesanato, especiarias, tapetes, bijuteria, prata, comida, roupa, é possível encontrar um pouco de tudo. A parte má é que só não estripam os turistas se não puderem, o que torna as compras um pouco difíceis e exaustivas, já que é necessário regatear tudo, e com convicção, coisa que A D O R O fazer. 

Ainda assim, depois de muito batalhar, lá conseguimos trazer umas estatuetas em madeira por cinco dólares cada, açafrão e chili, comprados à senhora da imagem, e t-shirts em algodão a dois euros, que, ainda hoje, temos e são de muito boa qualidade.

A muito custo, o meu Amor lá me conseguiu arrancar do mercado e seguimos para a próxima paragem:  A fábrica de cigarros.  Apesar de não estar super entusiasmada, até porque deixei de fumar, convictamente, há mais de cinco anos, até achei piada Q. B. ao local. No Myanmar, a industria do tabaco está bem enraizada, e, infelizmente, morrem, anualmente, mais de 65 mil pessoas por doenças relacionadas com este terrível vicio. Um maço de tabaco ordinário custa menos de um dólar, pelo que é super fácil comprar. 

O nosso anfitrião, do qual, também, não me recordo o nome, era um rapaz novo, simpático, com ar de filho do patrão. Para além da produção de charutos e de cigarros artesanais, dedicava-se ao alojamento turístico e à venda de artigos em lacre. Explicou-nos aspetos interessantes sobre a produção e os sabores dos cigarros e, também, do seu projeto em atrair, cada vez mais, estrangeiros para o lago, para o qual pediu ajuda através da divulgação da sua página de facebook nas nossas redes sociais. 

No fim, inevitavelmente, gastámos quinze dólares na compra de uma caixa circular em lacre, como o da foto, com cigarros artesanais, e mais alguns para oferecer. Eram tão bons, mas tão bons, que, ainda hoje, estão cá em casa sem ninguém lhes ter tocado. 

A custo, lá saímos da loja, até porque a visita estava a ser realmente interessante. No entanto, estávamos a morrer de fome, e já era hora do almoço. Meio a medo, lá tentámos explicar ao nosso barqueiro que precisávamos de encontrar um restaurante onde não fossem (muito) vigaristas. Apesar do gesto afirmativo, fiquei com muitas dúvidas. Será que havia (mais) uma armadilha à nossa espera?   (Não fujam: To be continued). 

Não perca a crónica anterior:

Crónicas do Myanmar: Descobrir o Inle Lake – Parte I

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